Virada Cultural no bairro Bonsucesso



Neste último fim de semana, dias 25 e 26, ocorreu a primeira Virada Cultural em Rio Claro SP. Não foi a virada cultural tradicional, projeto estadual encaminhado para cidades do interior, mas foi um projeto municipal com apenas participações dos artistas locais. Assim grupos como o Kino-Olho e Cia  Tempero D'alma puderam manifestar suas atividades e obras.

No sábado dia 25, no Centro Comunitário do bairro do Bonsucesso (periferia da cidade de Rio Claro), foram realizados uma apresentação teatral do monólogo "Faz de Conta" com Luana Menezes e a exibição de vários curtas-metragens realizados pelo Kino-Olho.

Um público não tão acostumado a uma arte mais erudita, estavam ali, curiosos para entender. A própria escolha dos filmes se fez pela opinião do público, além de cada filme haver uma posterior discussão, deixando o público manifestar seus pensamentos sobre os temas. Durante as exibições pudemos ver as expressões e identificações que o público teve, independente de uma explicação anterior.

Nestes eventos o Grupo se surpreende com a reação do público, surgindo admiradores e curiosos que querem experimentar ser artistas, perguntando como terem acesso a tudo isto. Mais surpreendente é quando descobrem que tudo foi feito na cidade, de forma profissional, e nunca pensado como viável pela platéia.

Nesta oportunidade pensamos em como introduzir e melhorar a incorporação de nossos trabalhos a um público cada vez maior, em nossa própria cidade. Diferentemente de atividades ocorridas na capital, em Rio Claro o público é modesto e aos poucos surge, fazendo com que o trabalho seja modesto como de pequenas formigas. Principalmente se pensarmos que boa parte do público imagina que Cinema só é feito em Hollywood. O próprio estilo do grupo sempre almejou fazer algo ao mesmo tempo artístico e que possa ser sentido por qualquer público.

Os resultados vemos nos rostos dos jovens e famílias presentes no Bonsucesso, revelando apreensões, risos e reflexões. O engraçado é que logo na esquina ao lado havia um bar aberto com o som bem alto, tocando músicas erotizadas, em que compartilhavamos o mesmo público durante esta noite. Alguns passavam pela porta e assistiam um pouco distante, mas ao mesmo tempo apreensivos pelas possibilidades que aquela apresentação artística tocava a si.
Em meio a esta noite com um público e espaço diferenciado fizemos algumas fotos e um registro em forma de filme-ensaio.

















O exercício de fazer Cinema

                                                      (Poster Filme ensaio 23/05/13)


Toda semana o Grupo Kino-Olho, em Rio Claro SP, se reune para discutir teoria e prática cinematográfica. Um dos métodos usados para se apreender as conversas é o "Filme-ensaio". Uma espécie de exercício, onde não existe inicialmente um resultado almejado, mas uma relação entre  conteúdo e forma. Pensamentos sobre vanguardas, escolas e realizadores são pautadas em "conversas audiovisuais", em qualquer tipo de equipamento, improvisando uma ação cênica.
Para o grupo, Cinema é um hábito rotineiro, possível de ser notado em qualquer espaço e contexto. Aqui o mínimo é sempre o melhor meio para exercitar o controle e observação cinematográfica. Os participantes, mesmo ainda iniciantes na área, produzem a seu modo um conteúdo audiovisual, inspirado nas conversas e conteúdos ditos. A questão não é de imitar algo, ou experimentar técnicas de terceiros. O que se apreende é o seu próprio modo de observação, sabendo lhe dar com a estética particular que se organiza a seu próprio modo.
Não há a forma certa, pois o que funciona para um realizador, não funcionará a outro. Logo de inicio precisamos esquecer destes tipos e tentar ter uma certa "ingenuidade" diante de uma possível cena. Um dos grandes nomes discutidos na noite do dia 23 de maio de 2013 foi o de Jean-Luc Godard. Para entendê-lo um pouco a mais, assistimos à um de seus filmes roteiros, o que relaciona seu longa Sauve qui peut ( la vie) . Para Godard os filmes roteiros serviam como um modo de organização de suas idéias pré ou pós filme. Insights e pensamentos sobre a sétima arte se misturam com uma apresentação do que seria o filme que estaria a realizar.
Este exercício, feito em outros momentos, era a base para se firmar em pontos estratégicos em que o diretor mergulhava para compreender o próprio filme. Estes filmes roteiros estavam longe de serem alguma espécie de bastidores de um set de filmagem, mas almejavam entrar na própria mente do autor para descobrir uma justificativa.
Godard já havia ressaltado o interesse de filmes que relatavam mais o processo do que uma idéia pronta, ao lembrarmos de seu Grupo Dziga Vertov, formado na década de 70. Naquele momento surgia um reconhecimento a um grande realizador russo dos anos 20, Dziga Vertov, que não fora valorizado em seus anos de produção. Isto se deve à sua estética que sempre queria ressaltar o mecanismo de se produzir um filme, revelando os aspectos da ilusão do espetáculo (algo que apenas seria explorado através de vanguardas modernistas do Cinema nos anos 60).
Vertov criou um termo para poder ilustrar este poder único, que apenas poderia ser visto pelo olhar mecânico da filmadora e de uma mesa de corte. A este olhar ele denominava "Kino-Olho".
Assim, entre outras conversas paralelas, os membros do Kino-Olho, reunidos nesta quinta-feira a noite no Centro Cultural Roberto Palmari, realizaram mais um filme ensaio.
Desta vez a cena foi improvisada durante a própria duração dos planos, onde atores recebem instruções no próprio ato. Suas reações são espontaneas por não saberem o que exatamente devem fazer, apenas esperam, com pequenos gestos e falas, formar aos poucos uma possível narrativa. Mesmo assim há momentos em que tal descrição é abandonada para explorar novas sensações.
No elenco deste filme ensaio estavam a Larissa Carnecine e Jonata de Jesus. Equipe e atores se misturam no mesmo quadro, improvisando tudo que é visto, sem pensar, mas apenas agir de formas diversas e antagônicas.

Link do filme ensaio https://vimeo.com/66945982

(Stills do filme)








A visita inesperada de uma câmera e uma televisão



O Grupo Kino-Olho ministra oficinas em bairros e escolas desde 2006, passando  por várias experiências e muitas histórias para contar. Não foi diferente ao levar mais duas Oficinas Introdutórias de Video para os alunos da Escola Municipal Armando Grisi. A cineasta e integrante do Grupo, Cláudia Seneme do Canto, é a atual responsável pelas oficinas introdutórias e busca a partir de experiências o seu próprio modo de trabalhar com estes alunos.

Cada Oficina é diferente da outra, principalmente na idade, trabalhando com crianças de 8 anos (em turmas escolares)  até senhores de 70 anos (em grupos de terceira idade). Há sempre a flexibilidade para identificar cada perfil e focar sobre suas necessidades para melhor usar as ferramentas do audiovisual. Basicamente os alunos, logo após terem as noções mínimas de produção, entram de cabeça em sua própria realidade, explorando situações corriqueiras que mereçam um olhar artístico.

Os alunos podem contar a história de seu bairro, focar numa campanha contra a poluição na cidade, ou mesmo contar seus sonhos, etc. Nada é impossível se temos a criatividade aliada com as possibilidades mínimas de produção. Em uma destas oficinas, os alunos, inspirados no filme hollywoodiano "As Aventuras de Pi", queriam a qualquer custo viabilizar uma história onde uma família sofre um naufrágio em alto mar.

Longe de querer imitar, a Cláudia, junto às professoras da Escola tiveram a idéia de construir um navio e o mar. Alunos e professoras se empenharam a criar um navio através de colagens de jornais e revistas, assim como um mar constituído por lençois e tecidos azuis. Tudo feito de forma minimalista, pois depois de muitas experiências, vêmos que precisa de muito pouco para os alunos acreditarem e sonharem por alguns minutos.

Na segunda turma, o foco esteve num fato ocorrido na realidade; quando encontraram uma cobra em um dos terrenos pertecentes a escola. Este fato serviu de inspiração para no vídeo criar uma situação imaginária em que um dos alunos fora mordido pela cobra. Assim os amigos procuram socorro e criam uma campanha para diminuir os lixos despejados no terreno da escola, atraindo animais peçonhentos. Neste caminho criamos uma forma deles pensarem sobre problemas reais e fazerem propostas para resolvé-los.

A professora Cláudia, frente à esta criatividade, faz de tudo para auxiliá-los e atingir um produto final, digno de estreia. Nesta metodologia de ensino/aprendizagem também surge a discussão se precisaria ou não de um produto bem acabado, podendo ser chamado de "mais profissional". Assistindo aos vídeos e o próprio processo das aulas, a resposta surge de imediato que o caminho não é da  "profissionalização" ou da " técnica".

As oficinas pelo próprio nome diz são introdutórias para mostrá-los as possibilidade deste mundo do Cinema. Após esta experiência, os interessados são convidados a frequentarem o curso permanente no Centro Cultural, tendo uma outra profundidade de estudo. No final destas oficinas, a Cláudia recebeu cartas e um desenho dos alunos que tinha uma câmera encontrando a televisão...

As oficinas e o curso de cinema são apoiados pela Secretaria da Cultura e Prefeitura Municipal de Rio Claro. Abaixo compartilho o texto na íntegra escrito por Cláudia Seneme do Canto, relatando suas experiências e as fotos da produção.

Link do vídeo "O naufrágio"  http://youtu.be/H9f4xc_y3GU
Link do vídeo "Uma visita inesperada" http://youtu.be/CW-ICnvBsxE

"O que vale mais: produzir um filme com os alunos ou produzir um filme para os alunos? Este é o desafio que tenho enfrentado nas oficinas que ministro nas escolas de Rio Claro no Projeto Oficina Introdutória do Grupo de Pesquisa e Prática Cinematográfica Kino-Olho. Nos dois primeiros encontros explico aos alunos as funções básicas dos profissionais do cinema e depois começamos a pensar na elaboração do roteiro. No jogo entre uma sugestão e outra da professora e as idéias dos alunos, sempre vence alguma história mirabolante deles. E a professora responde animada, mas com um pouco de receio do desafio da gravação: "o filme é de vocês!". E assim as coisas vão acontecendo, como ocorreu nesta última produção da 4ª série do Armando Grisi, dois alunos realizaram o roteiro, a aluna Isabela pensou na história em que cinco crianças realizam um passeio no zoológico e o aluno Pedro pensou em um enredo em que uma família enfrentava um naufrágio. Duas histórias que precisariam de uma grande produção, mas não tinha como escapar, desta vez não tinha nenhum outro aluno com um roteiro mais simples para realizar. A sala escolheu a história de Pedro e a professora sugeriu conversar com o professor de artes para junto com a sala fazerem um barco de papelão.
Dia da gravação, o barco pronto e os alunos inspirados correndo de um lado para o outro querendo segurar a câmera, passar na frente dela dando um "tchau", mexer na claquete e etc… a professora com um desafio, fazer o filme do naufrágio de um barco no palco de uma escola sair do papel! Aí voltou a questão: como fazer esta experiência maluca de se fazer um filme nestas condições ser uma experiência para eles e não algo que eu fizesse acontecer sozinha usando-os como robôs para conseguir concluir o meu trabalho, suspirar e dizer no final, missão cumprida?! 
Com muita calma e equilíbrio, igual ao navio em um mar de edredões, comecei a distribuir novamente as tarefas em meio a um caos de "eu quero fazer claquete, aí, mas ele já fez isso duas vezes agora é minha vez, professora deixa eu atuar?". Não adiantava querer fazer algo artístico e muito elaborado, o importante era o caminho meu e deles na busca de fazê-los descobrir uma nova forma de expressão, no sentido mais superficial da palavra, fazê-los matar a curiosidade de mexer em uma câmera, bater uma claquete, apertar os botões, perceber o que era um plano detalhe, um plano geral, ou seja, brincar um pouco com aquelas novas ferramentas! E isso é muita coisa para quando se é criança!
Após duas horas de filmagem e uma parte do roteiro excluída por já termos excedido o tempo, comecei a simplificar toda a gravação e fazer rodízio com os alunos que ficavam atrás da câmera e pedir para os que já tivessem filmado, voltarem para a sala evitando mais confusão. No final da gravação fizemos alguns offs para preencher as partes que tínhamos cortado do roteiro e assim foi.
Editei o material em casa e passei o filme para a sala após uma semana da gravação, alguns dos comentários dos alunos eu guardei:
"Nossa, o filme ficou muito curto", "que música triste", "eu não gostei do filme professora", "eu achei que ficou bom", "vamos ver só mais uma vez", "a gente vai fazer mais filme", "vamos fazer um de uma hora", "quando você volta professora?". Além dessas falas, recebi duas cartas de duas alunas, uma com um desenho de uma câmera com pernas encontrando uma televisão e outra em nome de toda a sala em agradecimento."





















Filme ensaio 2/5/13


Em mais uma reunião semanal, o grupo Kino-Olho continou seus debates e realizou mais um filme ensaio. O assunto desta quinta-feira foi o "tempo cinematográfico". Para muitos o cinema se basta apenas em contar uma boa história ou entreter o público durante minutos ou horas. Porém para os grandes artistas da sétima arte, há outros fatores que definem se um filme é bom ou não. A história acaba servindo de um guia para facilitar a apreensão e não como foco principal.

Há estéticas e propostas de como narrar. Este "como" é a parte mais importante para os grandes cineastas, que assinam suas realizações, trazendo ao público algo imensurável. Estes não desejam que seu público saia das salas apenas recordando das histórias ou dos personagens. O cineasta deseja que seu público tenha uma reflexão maior que ultrapassa o próprio tempo da história.

Ai chegamos na questão do tempo, ou do ritmo em que elementos entram e saem do quadro do plano de cinema. O modo de enquadrar, combinado a um tempo de contemplação é o que define uma obra de arte para o cinema. Cada diretor põe em prática sua visão através do modo que trabalha com o tempo. O grande diretor russo Andrei Tarkovsky em seu livro "Esculpir o tempo" compara a essência de filmar como um ato de esculpir o tempo.

Um dos fatos lembrados na noite foi a recente discussão entre o cineasta Kleber Mendonça e o diretor da Globo Filmes, desafiando este último a conseguir produzir pelo menos três filmes por ano, que tragam uma reflexão maior ao espectador. Completamos que seria uma reflexão que ultrapasse o simples prazer de assistir à uma história ou rir das performances de comediantes, ir além...

Para ilustrar estas discussões foram exibidos trechos e trailers de filmes como Som ao redor, Free Zone, Eros, Café Lumiere e Para sempre Mozart. Este último do cineasta francês Jean-Luc Godard, um dos principais nomes do cinema moderno, e que provocou grande parte das discussões da noite.

Pensando  nestas e outras questões, os participantes da última reunião do Kino-Olho pensaram numa nova série de ensaios a respeito do tempo, usando apenas de uma fonte de luz comum e uso de aparelhos simples de captação de imagens, como por exemplo o celular.

O primeiro destes ensaios foi a interação feita pelo jovem ator Tarcísio Silva com uma luminária na parede. Neste ensaio, nenhuma história legível foi proposta, até para ser um desafio. Os interessados em participar destas relfexões e práticas, basta comparecer nas reuniões no Centro Cultural toda quinta-feira às 18 horas, gratuitamente. Veja o filme ensaio abaixo:


Revista Cinema Caipira de maio


A revista Cinema Caipira ISSN 1984-896x, número 51, já está disponível para encomenda e download gratuito em diversos formatos. Neste mês contamos com os seguintes artigos;

" Ida do Diabo
de João Paulo Miranda Maria

"O cinema cômico levado a sério ”
de Ana Flávia Ferraz e Otávio Cabral

" Além, muito além das montanhas... "
de Bruno Barrenha

"Pornô, a história escondida"
de Rafael Spaca


* Pôster "Ida do Diabo".
de D

OBS: Os participantes desta edição tem direito a uma revista, bastando enviar por e-mail seus endereços.

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